terça-feira, 10 de setembro de 2013

Da urbanidade







E se sou impedida de te alcançar, te toco com meus olhos.
Logo, porém, sinto minha alma aquecida, pois o teu olhar me abraça, me beija e me ama, sem contato.











terça-feira, 3 de setembro de 2013

Sobre anzóis retornados


Desde a infância um pensamento martelava minhas ideias: Se a vingança pertence a deus, e deus é bom, logo, a vingança também é boa?

Ao falar com um amigo sobre como a vida se encarregou de tomar suas dores e trazer sobre seus mal feitores as mesmas desventuras de que foi vítima, ele disparou uma frase muito reflexiva sobre a divina comédia humana:

– Foi um troco justo, de Deus, que é sábio, sem ser cruel, porém de uma ironia transcendental.



segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Porvir


Tenho agora maior compreensão sobre como arruinar a raiz da frustração sem perder a doçura de um olhar gracioso sobre a vida.

Um amigo celebra hoje a conclusão de mais um trecho de sua jornada. Uma trajetória turbulenta que, ao fim, tornou-se inusitadamente renovadora. Ao perguntar-lhe sobre o que projeta para o novo ciclo que inicia, para que não sofra novamente, ele respondeu:

– Não tenho expectativas. Tenho esperanças.



quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Da presença



A sinceridade da companhia não consiste em sempre estar, mas sim em sempre ser.

Mesmo sendo esporádica a visita dos olhos, a intimidade da carne e a companhia da voz, a estabilidade do contato das almas independe da afirmação cotidiana da matéria. Por mais angústia que isso traga.

Porém, segundo um bem querer articulado, chegará o dia em que há de se viver as coisas que ainda não tivemos tempo, e que ainda não são, mesmo que delas tenhamos tanta saudade.





segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Da comunhão

O convívio é uma criança traquina que corre sob o muro que divide os terrenos da felicidade e da guerra.

Ao tropeçar e cair para um dos lados, as feridas da queda expõe nossa humanidade crua. Algumas vezes de forma bela, gentil e encantadora, mas, outras vezes, ridiculamente mesquinha, pequena e espantada.

Há os que tentam dar de ombros e disfarçar a sua debilidade de coexistência, mas é inegável que o objetivo de nossas relações sociais sempre será o de sermos reconhecidos e amados.

Rogo que nunca precisemos da solidão para aprender sobre a convivência.






quarta-feira, 24 de julho de 2013

Sempiterno


Ao levarmos em conta a perenidade da união, não importa quanto o tempo passe. Seis meses ou sessenta anos, sempre estaremos no começo do namoro.





quarta-feira, 3 de julho de 2013

Antropofagia


Tudo o que vive, alimenta-se. Sejam seres biológicos ou psíquicos, em seus mais diversos apetites e consumos.

O amor, por exemplo, aprecia a degustação do ser amado, porém à paixão apetece devorá-lo. Neste banquete dos sentimentos há os que estão à mesa empanturrados de presença e os subnutridos de lembrança. 

Diferente destes, prefiro estar saciada em você.



sábado, 8 de junho de 2013

Das apostas

Conversando com um amigo que aguarda a superação de um amor que se foi, surge a intuição de que talvez os fracassos não sejam tão relativos à maneira como se ama, mas sim às pessoas que se amam. 

Por mais verdadeira que seja a intenção mútua do relacionamento, por vezes a energia natural de cada um sempre falará mais alto e agonizará pela plenitude que mora longe daquele romance, e essa incompatibilidade sempre causará conflitos e sofrimento.

Amar é uma arte, mas o amor é um jogo. Amar é uma decisão que exige talento, esforço e destreza para prosperar. Mas o amor... O amor é sorte.



quarta-feira, 29 de maio de 2013

Elementar, meu caro


Por mais discreta que seja a paixão, ela sempre deixa vestígios. Sempre haverá um brinco perdido entre as cobertas, uma liga de cabelo, um cinto jogado pelo chão ou um anel na cômoda denunciando sua passagem física pelo ambiente. 

Como um criminoso descuidado, a paixão se incrimina nos detalhes abandonados despretensiosamente em meio ao seu usufruto. Contudo, de todos os indícios, os lençóis que delatam seu perfume são as evidências cruciais de que apesar da partida, ela continua enchendo uma cama. 

Divirto-me ao colher pistas do nosso amor pela casa.


segunda-feira, 27 de maio de 2013

Da solidão

Estátua Eleanor Rigby, na cidade de Liverpool.
Dedicada a todas as pessoas solitárias.


Conheço gente que sofre demasiadamente pela solidão romântica, por não deparar com alguém que faça companhia ao seu coração.

Por estarem tão atarantados com todos os ruídos que poluem suas vidas, deixam passar despercebida alguma bela canção que esteja tocando ao fundo, e por não percebê-la, não caminham em sua direção.

Existem tantas pessoas sozinhas no mundo... Por que elas não se encontram?


terça-feira, 30 de abril de 2013

Fraterno

Com frequência nas relações familiares nossa doação é tão instintiva que sequer sublinhamos. E justamente aí, nessa inconsciência ingênua da esperança de que vínculos sanguíneos enlacem a confiança, é que mora a grande raiz da amargura.

Não quero pensar nessa expectativa congênita como gratidão, pois não há benevolência na obrigação consciente da retribuição, prefiro antes chamar de consideração, de fraternidade, de amor.

Quando é habitual engolir elefantes em favor de quem se quer bem, esperamos que em contra partida nossos mosquitos também sejam generosamente digeridos.




quarta-feira, 10 de abril de 2013

Linda flor




Apesar de cada vez mais reconhecer o mundo como um jardim repleto de espinhos, tenho encontrado refrigério ao ver florescer sorrisos de vitória.

Minha fortuna tem sido o prazer em cultivá-los e cativá-los, e assim o farei com zelo, percebendo este bem-querer desabrochar.





quinta-feira, 21 de março de 2013

Frondosa







Um amigo ensinou-me sobre a vitalidade do amor. Em um belo entardecer, disse: 

- Eu gosto da Camila há tanto, tanto tempo, que às vezes parece que ela é uma árvore que plantei no meu quintal.












terça-feira, 12 de março de 2013

Natalício


Quando adolescentes, nossa vida é novidade. A cada ano, no dia em que comemorávamos a data de nossa chegada neste mundo, essa novidade celebrada era o evento solenizado por todos os nossos jovens amigos que também esperavam pelas suas datas e pelos aniversários cada vez mais repletos na folhinha da vida a cada ano e amigo acumulado.

Com o passar do tempo a vida vai deixando de ser novidade e passa a ser contabilizada como dias acumulados, contas acumuladas, tarefas acumuladas... E fatidicamente em um ano de atropelos, acabamos esquecendo um aniversário antes muito esperado.

Neste seu aniversário fui eu quem envelheceu.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Da dependência deslumbrada



Trago uma amiga cujo recente namoro converteu seu telefone celular em um dispositivo dedicado à redação instantânea de trechos que formam uma grande ata sobre tudo o que faz ao longo do seu dia, sempre mantendo a outra parte atualizada de todos os seus passos.
A princípio me irritou a sujeição descabida. Porém havia esquecido que ela está apaixonada, e que a independência emudece diante desse entusiasmo. A paixão só sobrevive no cativeiro, onde descobrirá se o excesso trará o abuso ou o vício.


sábado, 26 de janeiro de 2013

Das expectativas







Conheço um rapaz cujo coração está bloqueado em virtude de um romance falido e doloroso.
Por tanto temer, ensimesmou-se.
Ele não sabe que para abiscoitar a felicidade é preciso sofrer quantas vezes forem necessárias.



quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Acende, ascende

Nos habituamos com emoções incendiárias que detonam ao estopim do acaso, e é difícil entender os passos miúdos do envolvimento gradual.

Não é fácil para a pipoca de microondas entender como um milho de tacho pôde chegar ao seu mesmo patamar sem ser inflamado por ondas de dentro pra fora e ter as entranhas arrebentadas de euforia instantânea. Pobre ser extasiado.

Então, por sorte, em um dia desprevenido descobrimos o encanto tímido que não nos assalta a consciência e arde em chamas, porém gradativamente aquece de fora para dentro e se torna apto à explosão, o que também é um arrebatamento.